É frequente nos meios de comunicação debates envolvendo a chamada "guerra cambial" entre os países. A recente queda mais acentuada do dólar no Brasil acendeu a luz vermelha no governo e foram então tomadas diversas medidas para reverter essa tendência. Acredito, contudo, não ser esse o caminho mais adequado para proteger e fortalecer nossa economia. O Brasil optou pelo regime de metas de inflação e câmbio flutuante. Foi esse regime que possibilitou os inúmeros benefícios que temos vivenciado nos últimos anos (e largamente explorados durante as campanhas eleitorais). Para alguns, mexer no câmbio parece efetivamente a medida mais fácil a fim de conferir maior competitividade à indústria nacional. Mas esse controle incorre em vários problemas. O primeiro deles é que dificilmente o seu efeito perdura no tempo. É até possível atrasar uma tendência de valorização cambial, mas em pouco tempo o mercado descobre as inevitáveis brechas legais e, quando apoiado em fundamentos econômicos, como é o caso atual, retoma com ainda mais força as suas posições. A fraqueza do dólar não se dá apenas em relação ao real. É um fenômeno mundial sustentado por fundamentos econômicos fortíssimos. Não se trata de mera especulação. É sim um ajuste que o mercado tem feito em decorrência da fraqueza da economia americana, dos seus enormes déficits fiscais e comerciais, da emissão de moeda sem precedentes na história etc. Se mesmo diante desse quadro o governo resolver adotar novas medidas para frear essa tendência, acredito que o resultado para o Brasil seria, ao final, negativo. Isso porque, manobras contábeis à parte, temos no Brasil um importante déficit, o que torna a nossa economia bastante depende do capital externo para o seu financiamento. Supondo que o governo conseguisse de fato impor um cerco muito grande ao ingresso desses recursos, o financiamento do nosso déficit se tornaria inevitavelmente mais caro. No limite, poderia colocar em risco a rolagem da dívida pública (isso foi ligeiramente sentido há poucos dias, com uma maior dificuldade do governo em vender NTNs-B). Anúncios de medidas "surpresa" pioram a situação. Práticas como essa só fazem com que o mercado exija maiores prêmios para a alocação dos seus recursos no país. Mais importante do que mexer na taxa de câmbio, que tem por efeito beneficiar apenas parte dos agentes econômicos, seria muito mais eficaz, duradouro e distributivo, atacar o custo-Brasil. Nesse campo temos muito o que avançar. Por meio de reformas trabalhista, política, tributária, investimentos maciços em educação e infraestrutura, respeito às regras estabelecidas e transparência na condução econômica, estaríamos contribuindo enormemente para a melhora das margens, não só dos exportadores, mas de todos os agentes econômicos. Medidas como essas tornariam o nosso parque industrial muito mais eficiente e competitivo. Mexer na taxa de câmbio pode parecer a solução mais simples e de rápida implementação, mas o caminho mais fácil é também por vezes o caminho errado. Afora essas reformas, deveríamos, ainda, sem engenharia contábil, aumentar o superávit primário. Isso abriria espaço para uma política monetária mais expansionista, contribuindo também para uma depreciação do real. Fizemos a escolha de quem irá presidir o Brasil. É praxe haver certa condescendência na proposta e implementação de reformas no início de mandato. Esperamos que o novo governo saiba aproveitar esse momento e não proponha medidas heterodoxas para depreciar o real, mas concentre suas forças em atacar os efetivos gargalos que minam a competitividade da indústria nacional. Já fizemos, no passado, nossa escolha pelo regime do Plano Real (câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário) e ela tem se mostrado acertada. O governo pode e deve se utilizar de instrumentos para frear oscilações muito drásticas no câmbio, mas, afora isso, deixemo-lo flutuar e foquemos naquilo que realmente importa. Se a inflação aleija e o câmbio mata, a ineficiência enterra de vez qualquer possibilidade de termos uma economia mais competitiva. Esse novo governo tem em suas mãos o poder de desenhar um futuro fantástico para o Brasil, mas, para isso, precisará enfrentar de vez essas questões e deixar de lado as soluções aparentemente mais fáceis, conduzindo a economia de forma responsável implementando as reformas que o nosso país tanto necessita. |
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
Se a inflação aleija e o câmbio mata, a ineficiência enterra
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário